segunda-feira, 17 de julho de 2017

Capas históricas



Minha capa predileta entre os discos dos Rolling Stones é a de Tatto You, álbum de 1981, que foi o responsável por me transformar em um incondicional fã da banda. Até então, apenas respeitava o conjunto por sua fundamental contribuição para a história do rock. Mas eu tinha apenas cinco anos de (profunda) vida roqueira, ainda engatinhava, portanto dêem um desconto para o minha (in)justificável indiferença. Meu álbum predileto do grupo, entretanto, é o seminal Sticky Fingers, de 1971. Ambos poderiam tranquilamente pontuar nessa coluna que reverencia as capas históricas, assim como o eleito da vez, Exile on Main St, de 1972, o único álbum duplo de inéditas dos Stones (sem contar os ao vivo). Muitas histórias (de arrepiar) estão envolvidas na concepção do décimo álbum deles.

A capa do disco foi produzida a partir de fotos de Robert Frank, um grande fotógrafo americano, e se encaixou perfeitamente ao que os Stones buscavam. Suas imagens bizarras, de pessoas esquisitas e do cotidiano da cidade onde boa parte do disco foi concebido, mescladas com fotos da banda, fizeram história e inspiraram outras capas de discos de rock nas décadas seguintes. Exile on Main St. contou com uma capa pôster desdobrável e incluía uma série de 12 cartões postais com uma sequência de inserções de imagens de um filme feito pelo fotógrafo Norman Seeff. A contracapa vinha com várias fotos dos Stones. A "mulher misteriosa" retratada no lado inferior esquerdo é Chris O'Dell, assistente pessoal da banda. Muitas das fotos que compõem o conceito visual do álbum foram extraídas do próprio livro de Robert Frank, The Americans, de 1958.

A produção musical de Exile on Main St coincidiu com o auto exílio imposto pelos Stones para fugir da agressiva política tributária do governo britânico. A banda, que já era um grande sucesso, encontrava-se falida por causa de uma monstruosa dívida com o fisco em razão de fraudes perpetradas pelo então empresário, Allen Klein. Eles optaram por se mudar para o sul da França, em Ville Franche-Sur-Mer. A mansão de 16 quartos que os abrigou, chamada de Villa Nellcotte, poderia seria o que se chama de um completo paraíso, se não tivesse sido utilizada pela Gestapo como quartel general durante a ocupação francesa na Segunda Guerra Mundial. Há quem diga que haviam suásticas ainda pintadas em alguns cômodos da casa.

O período na Villa Nellcote também coincidiu com o profundo mergulho de Keith Richards nas drogas, especialmente a heroína, da qual ele só se livraria na década seguinte. Também foi durante a passagem pelo Sul da França que ele consolidou seu destrutivo romance regado a vícios diversos e brigas pesadas com Anita Pallenberg. Durante a passagem por Nellcote, os papéis dentro da banda foram se definindo. Jagger, ao contrário, investiu em um relacionamento sério com Bianca, com a qual teve o primeiro de seus oito filhos, Jade. Enquanto Keith mergulhava na química, cabia a Jagger conduzir os negócios da franquia, assim como a direção musical, já que o vocalista começava a se enveredar por outras searas musicais fora do rock, o que fica claramente demonstrado na diversificação de gêneros inseridas nas 18 canções de Exile.

As intermináveis festas e desfiles de loucuras presenciados na mansão também determinaram o futuro do baixista Bill Wyman que não aprovava aquele comportamento caótico e foi aos poucos se afastando até pedir o boné em definitivo no começo da década de 90. Outro que se assustou com um ambiente tão conturbado foi o recém-chegado guitarrista Mick Taylor, que gravava seu terceiro disco com a banda e abandonaria o barco após a gravação de It’s Only Rock and Roll, em 1974.

Embora lançado em 1972, Exile começou a ser composto quatro anos antes. Para evitar ter que se submeter ao jugo de Allen Klein, muitas das músicas gravadas anteriormente ficaram “escondidas” e foram retrabalhadas no sul da França. Assim, os Stones salvaram a divisão da receita dos direitos autorais com o carrasco empresário, o que não foi possível com clássicos como Brown Sugar e Wild Horses, que entraram em Sticky Fingers. Muitas faixas que viriam a ser aproveitadas em Exile foram gravadas entre 1969 e 1971 no Olympic Studios e em Stargroves, a casa de campo de Jagger na Inglaterra, durante as sessões para gravação do álbum anterior.

Independente de todo o tumulto que foi aquele período para os Stones, o resultado final foi magnífico. Exile On Main St. traz uma receita tão variada e consistente que fica difícil contestar a admiração que muitos têm por esse disco, considerado o melhor álbum da banda e o último grande trabalho feito por eles. A abertura com Rocks Off e a sequência perfeita, matadora e variada mostra o tamanho entrosamento do quinteto. Além da polícia e de traficantes e viciados, a passagem pela França foi marcada pela constante presença de músicos dos mais diversos naipes, que aproveitavam a farra e deixavam suas contribuições durante as sessões musicais, tais como Nicky Hopkins, Bily Preston, Ian Stewart, Bob Keys, Kim Price, Jimmy Miller, e Al Perkins, entre outros.

Com influências diversas como blues, gospel, jazz e country, Exile foi direto para o primeiro lugar das paradas da época. Entretanto foi recebido com críticas mornas pela imprensa especializada, que as poucos foi sendo seduzida pela riqueza musical ali contida a ponto de considera-lo como um dos melhores discos de rock da história.

Em 1987, Exile on Main St. ficou em 3º lugar na lista da revista Rolling Stone dos 100 melhores álbuns do período entre 1967 a 1987. Em 1993, a Entertainment Weekly classificou-o como o Nº 1 em sua em sua lista dos "100 Melhores. Em 2000, a revista Q o colocou como o 3º melhor álbum britânico feito até hoje. Em 2001, o canal de música VH1 colocou o álbum na 22ª posição em sua eleição para os melhores álbuns de rock and roll. Em 2003, o álbum foi classificado como o 7º melhor pela revista Rolling Stone na lista entre os 500 maiores álbuns de todos os tempos, a mais alta entre os álbuns dos Rolling Stones classificados na lista. Em 2006, a revista Guitar World classificou-o na 19ª posição entre os 100 Maiores albuns de guitarra de todos os tempos. Em 2007, a Associação Nacional dos Comerciantes de Gravação e o Rock and Roll Hall of Fame colocaram o álbum na 6ª posição em sua lista dos 200 álbuns definitivos que todo amante de música deveria ouvir. Este álbum está na lista dos 200 álbuns definitivos no Rock and Roll Hall of Fame. Em 2012, o álbum foi nomeado para o Hall da Fama do Grammy. Dois anos antes, o disco ganhou relançamento em edição luxuosa e voltou ao primeiro posto, estabelecendo um recorde inédito. Único álbum que havia sido nº1 a voltar ao topo ao ser relançado.

2 comentários:

  1. Lançado em mai/1972, "Exile" foi duramente criticado, fato que se reverteria com o tempo (vindo a ser considerado um dos momentos mais definidores e marcantes dos Rolling Stones). Parte do motivo do disco ter sido inicialmente mal recebido estava no fato que ele demandava um tempo para ser assimilado. Espalhado por quatro lados (no LP) que condensavam Rock'n'Roll,Blues, Soul Music e Country Music, "Exile" não trazia nada novo na superfície, no entanto sua substância era nova. Assim como "Sticky Fingers", que à primeira vista soou como uma mera declaração de modernidade drogada ("na qual os Stones agitavam drogas feito maracas", na elegante expressão do jornalista Greil Marcus), mas que depois as drogas acabaram servindo para um objetivo tanto figurativo quanto literal e o álbum tornou-se mais vasto e ambíguo com repetidas audições, também à primeira vista "Exile" pareceu uma terrível decepção com suas canções turvas e sem sentido, centradas em trivialidades. Entretanto, com o tempo, foi emergindo um trabalho magistral de vulgaridade poética. Um claro caso de temática que cresce e ganha relevo assentada sobre música formidável. Tomando a desolação que sustentou "Let It Bleed" e "Sticky Fingers" até um extremo, "Exile" era um álbum desgastado, surrado e cansado, e não apenas nas letras. Os vocais de Mick Jagger vinham enterrados no mix e a música trazia uma série de jams ricas e densas, com Keith Richards e Mick Taylor soltando incríveis riffs e solos. As canções prosseguiam os avanços de seus três álbuns anteriores, sem fazer seu Country soar forçado ou brega - ao contrário, era vívido e complexo, assim como as incursões do grupo pela Soul Music ou pelo Gospel. Enquanto as canções eram todas ótimas (incluindo as obras-primas "Rocks Off", "Tumbling Dice", "Torn And Frayed", "Happy", "Let It Loose" e "Shine A Light"), todos estes estilos se misturavam, apenas com algumas letras e parcas linhas de guitarras emergindo e dando a direção. Era o tipo de disco um pouco mais complexo (ainda que pudesse te pegar já de início), mas cada audição subsequente revelava algo novo e prazeroso. Poucos outros álbuns duplos foram tão ricos e magistrais como "Exile On Main St", que acabou se tornando não apenas um dos melhores discos dos Stones, mas também fixou um nível alto e um padrão de qualidade para todo o Rock.

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  2. O disco extra da edição Deluxe é sensacional, talvez o melhor que já ouvi desde que começou a avalanche de relançamentos especiais das mais diversas bandas. Não tem embromação, encheção de linguiça com live songs ou demos e outtakes que pouco acrescentam às versões oficiais. É pau puro!!! Sensacional. O Deluxe do Sticky Finger vai na mesma linha.

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