domingo, 26 de janeiro de 2025

Grandes álbuns do Prog-Rock: Arcadium - "Breathe Awhile" (1969)

O Arcadium já teve seu único álbum destacado pelo brother Marcão em sua sensacional e sempre aguardada coluna "Tesouros Perdidos" (leia aqui), mas senti tratar-se de um disco merecedor também de destaque aqui, onde colocamos luz sobre pérolas do Rock Progressivo. Na realidade, trata-se de uma obscura banda psicodélica liderada pelo compositor/vocalista cipriota Michalakis Stelios Sergides (que adotou o nome artístico Miguel Sergides), imigrante estabelecido em Londres, e completada por músicos ingleses: Graham Best no baixo, Allan Ellwood (órgão), John Albert Parker (bateria) e Robert Ellwood (guitarra solo). O nome "Arcadium" era uma referência a uma província da Grécia antiga, localizada na península do Peloponeso, lar do Deus mitológico Pan (da natureza, dos pastores, amante da música). Liderada pelo enigmático Sergides, que não era apenas o compositor/vocalista da banda, mas também um mestre da guitarra de 12 cordas, o Arcadium buscou capturar o espírito de uma geração lutando com as complexidades da existência por meio de melodias belas e harmonias intrincadas. A música que criaram ficou caracterizada por camadas de órgãos pesados, riffs de guitarra distorcidos e vocais angustiados (pense em The Doors, Iron Butterfly, Vanilla Fudge...), mas também havia uma abordagem específica lastreada na cena musical underground inglesa do final dos anos 60. A banda agregou diversas influências, as origens socioeconômicas de cada membro, as mudanças culturais daquela era (liberdade de expressão, experimentações, coragem artística), criando assim uma rica tapeçaria que explorava sons além do mainstream. No núcleo, a psicodelia, porém adornada de maneira cativante com uma colagem de complexidades. Música melancólica, entretanto vívida. A trajetória da banda começou no circuito de pequenos clubes da capita inglesa, onde foram aprimorando sua arte.
Em poucos meses, as performances chamaram atenção da gravadora iniciante Middle Earth (clube localizado em Covent Garden, Londres, que funcionou entre 1967-69, voltado para a música psicodélica, que por breves meses em 69 aventurou-se como selo - distribuição Pye Records - tendo lançado apenas 5 singles e 5 álbuns), levando a um contrato de gravação. Para permitir que polissem seu repertório e ajustassem as canções, o clube alugou uma mansão em Cambridge, onde a banda poderia ensaiar. Depois de uma semana, ela se mudou para o Pye Studios na Chandos Street, na capital inglesa. Em out/69, surgiu o single "Sing My Song"/"Riding Alone" (segundo do selo, após a estreia dos escoceses "Writing On The Wall"), produzido pelo cofundador do selo Dave Howson e pelo pioneiro da Folk Music inglesa Austin John Marshall. O álbum "Breathe Awhile" surgiu em nov/69 contendo sete faixas (todas composições de Sergides): quatro delas com cerca de 4 minutos, uma épica com 7 minutos e cada lado do LP consumido por uma faixa central, "I'm On My Way" (11:52) e "Birth, Life and Death" (10:45). Howson e Marshall coproduziram o álbum com o engenheiro Andrew Hendriksen.
O artista Michael McInnerney, autor do gatefold do álbum "Tommy", do The Who, fez a capa "Breathe Awhile" contendo foliões renascentistas nus num corredor de concreto com recortes de silhuetas. A contracapa mostrava três fileiras de fotos dos rostos dos membros: com máscaras de gás (em cima), cobertas com bandagens (no meio) e sorrindo respirando livremente (em baixo). Em meio aos desafios dos processos de produção (cheios de imperfeições típicos de selos emergentes, daí a baixa qualidade sonora das prensagens originais), o Arcadium até que conseguiu enfrentar os obstáculos e registrar um som que era exclusivamente da banda. Psych Rock pesado e depressivo, com órgão sombrio/sinistro, alto e soando como das catedrais, harmonias vocais agridoces e meio fantasmagóricas, melodias em tons menores, atmosferas apocalípticas, guitarras ardentes e encharcadas de ácido, tudo traduzindo o clima do final dos anos 60. As faixas refletiam a visão de mundo do compositor/vocalista Sergides, enigmática, que projetava pesadelo, descontentamento e luta. Sobre as fortes raízes psicodélicas, um Proto-Prog com números longos, feito por uma banda que certamente tinha talento, demonstrando que estava à beira de realizações bem maiores. Hoje é considerada uma verdadeira jóia do Acid Rock com toda sua visão deprê e sincera daqueles tempos no finalzinho dos anos 60. Temas improvisados, voz carregando carga emocional, órgão e guitarra tecendo teias de harmonias psicodélicas, como mantras, névoas surrealistas, tudo lentamente ganhando poder. Paisagens sonoras, espaços sonhadores/niilistas, jams psych, sentimento surreal, bateria hipnótica, transformando canções em experiências. Temos aqui o ponto em que o Rock Psicodélico foi se transformando no que originalmente viria a ser o Rock Progressivo, um momento perdido e obscuro, uma confluência da lisergia, do Rock pauleira (Hard Rock blueseiro) e das habilidades instrumentais Prog. Intensidade maravilhosamente alucinada, sensação nebulosa e esfumaçada, num som refinado, sombrio e de queima lenta. O Arcadium se desfez após a conclusão de "Breathe Awhile" devido a diferenças musicais entre Sergides e Robert Ellwood. 
Sergides montou o "Anaconda", um grupo de Acid Folk de três homens e duas mulheres que gravou um single, "Sympathy for the Madman" (em 2019, foi lançado um álbum contendo tudo que foi gravado). Sergides, mais tarde, se mudou para a Austrália e adotou o nome Michael Savanna Silver. Durante a segunda metade de 1977, ele gravou um álbum de Jazz-Funk (!) com uma banda de 13 integrantes que incluía o baixista Paul Wheeler. O álbum foi "Pure Silver" (78). Os irmãos Ellwood formaram o combo Glam Rock "Sisters" com um terceiro parente, Geoffrey Ellwood e lançaram três singles (entre 1973–75). Robert Ellwood esteve brevemente envolvido com o "Kingdom Come", de Arthur Brown, e sua participação ficou registrada no álbum "Jam" (de 1970).

Um comentário:

  1. Um disco maravilhoso! Recentemente adquiri a versão original em cd, com bônus.

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