sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

A última grande revolução do futebol

O Brasil de Rivelino, tricampeão do mundo,
foi uma das vítimas do carrossel holandês
O ano era 1974, o palco era na então Alemanha Ocidental, sede da décima Copa do Mundo de futebol. Ali, naquela nação dividida pela Guerra Fria, uma equipe encantaria o mundo e estabeleceria a definitiva revolução tática do futebol. A Holanda era, até então, uma seleção inexpressiva para o futebol, com apenas duas participações em copas do mundo e já nos longínquos anos 30. Mas naquele início dos anos 70 dois de seus clubes, Ajax e Feyenoord dominavam o cenário europeu com quatro títulos da então Copa dos Campeões da Europa. Algo estava para acontecer. E aconteceu.

O Brasil já era um gigante do futebol, com três títulos mundiais, um vice-campeonato , um terceiro lugar e dezenas de craques consagrados. Tinha em suas fileiras Rivelino, Carpegiani, Dirceu, Jairzinho, Paulo César Caju, Luis Pereira, Marinho Perez, Marinho Chagas, Edu e Piazza. Um baita plantel. Mas foi trucidado pela chamada Laranja Mecânica quando cruzou seu caminho nas semifinais daquele mundial.

A equipe comandada por uma dupla de gênios, o técnico Rinus Michels e o super craque cerebral Johan Cruyff, já vinha encantando e os adversários sequer entendiam o que acontecia, como era possível tamanha intensidade. Ironicamente aquela equipe não levantou o caneco. Assim como acontecera com o super time da Hungria de Puskas nos anos 50 (cuja força o Brasil também sentiu na carne na Copa da Suíça, em 1954), a Alemanha foi a campeã. Mas tanto Hungria quanto Holanda foram derrotadas por excelentes equipes alemãs.

A ESPN está reapresentando esses jogos clássicos das Copas do Mundo, com comentários e avaliações atuais de seus comentaristas. Uma delícia assisti-los de novo dessa forma, com outro olhar e desprovido da emoção do momento. Uma aula de história do futebol. Ao ver Brasil x Holanda novamente (só vi na época, quando tinha 12 anos) e com o conhecimento adquirido do futebol, pude testemunhar ali, como não tive discernimento na época, uma mudança vital na forma de se jogar futebol.

A troca constante de posições, a marcação sob pressão intensa no ataque, a saída em bloco para o contra ataque, as viradas de jogo e a ocupação impecável dos espaços eram novidades e tudo fazia parecer que o time holandês tinha muito mais do que 11 jogadores. E isso surpreendeu o mundo na época. Até se cruzarem na final, o ótimo e inteligente time da Alemanha teve tempo de estudar e neutralizar as ações holandesas, evitando a derrota em casa. Mas o que se viu naqueles jogos da Holanda de Cruyff, Neeskens, Rep, Krol e Resenbrink foi a última grande revolução do futebol. De lá pra cá, variações do mesmo tema.

Mas mesmo hoje, com gramados especiais, bolas mais leve, preparação física muito superior, não é tão fácil colocar em prática aquele que foi chamado de futebol total. Faz-se necessário jogadores inteligentes, talentosos e bem preparados, com boa leitura do jogo. Poucas foram as equipes que conseguiram colocar aqueles ensinamentos daquela forma em prática.

Ao ver o Brasil ser impiedosamente envolvido pela Holanda, validando a inovação tática sobre um time forte, talentoso e candidato ao título, tem-se a certeza da importância daquele time laranja. O Brasil, que havia mostrado na copa anterior um protótipo do futebol total, viu o aperfeiçoamento de sua filosofia de jogo do outro lado. A equipe, ainda comandada por Zagalo, técnico do tri, até que conseguiu fazer um jogo até certo ponto equilibrado, graças a raça e ao talento de seus jogadores. Mas era um time que ainda se ressentia da perda de sua grande referência, o rei Pelé. A Seleção Brasileira ainda não havia digerido o fim da era Pelé, que durou 14 anos. Mesmo com muitos talentos, era um time em busca de formação.

Outro aspecto que podemos perceber nesses jogos do passado é a condescendência da arbitragem com a violência. Brasil e Holanda foi um duelo extremamente violento. Carrinhos por trás, tesouras e carrinhos frontais com os dois pés no alto eram jogadas comuns, que nem cartões amarelos recebiam. Hoje com a velocidade e a força intensificadas, não se concebe tais lances sem punição. A propósito, a Copa de 74 foi a segunda a utilizar cartões para coibir lances ríspidos e foi a primeira a ter jogador expulso (em 70 não foi mostrado nenhum cartão vermelho). E o zagueirão palmeirense Luis Pereira, foi o primeiro jogador brasileiro expulso em uma copa, após dar um pontapé em Cruyff.

Um comentário:

  1. Grande dica! Vou procurar na programação. Tenho uma opinião toda pessoal sobre essa seleção holandesa. Se por um lado, foi inovadora (pela introdução de conceitos como jogadores com multifunções, marcação por pressão e rapidez/fluidez do jogo), sempre achei, por outro lado, aquilo tudo meio bagunçado, com enxames de jogadores correndo todos para a bola como numa pelada na AABB. ré-ré-ré... (bons tempos) Parece-me também que nem todos naquela seleção eram craques (um aspecto que o jogo "carroussel" exige, ao meu ver). Tanto que pegou a sensacional seleção alemã na EuroCopa e na Copa do Mundo e perdeu em ambas oportunidades. Penso que ficou o legado das ideias de Rinus Michels e Johan Cruyff, acima de tudo, para o futebol moderno (exemplo mais claro, o Barcelona de Pep Guardiola de 2008-2012). Assunto delicioso esse...

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