Você se lembra de Bobby Fuller? Com sua reverência flagrante a Buddy Holly, o roqueiro texano (nascido em 22/out/1942, em Baytown, TX) era uma anomalia no meio da década de 60. Empunhando uma guitarra Stratocaster e com seu som cheio e impetuoso, em seu melhor momento, ele soou como seu ídolo o faria caso tivesse sobrevivido (Holly morreu num acidente aéreo em 3/fev/1959, em Clear Lake, IA). Rompendo o Top 30 com "Love's Made A Fool Of You" (um cover de Holly) e o Top 10 (em mar/66) com "I Fought The Law" (escrita por Sonny Curtis, guitarrista dos Crickets, banda de apoio de Holly - com a morte do líder, ele acumulou os vocais e lançou o álbum "In Style With The Crickets" onde está a versão original desta canção). Surpreendentemente, como seu ídolo, Fuller também morreu (em 18/jul/66) quando estava se tornando uma grande estrela (ele foi encontrado morto dentro de um carro estacionado fora de seu apartamento em Hollywood, CA. Nada de contusões, ossos quebrados ou cortes. Nenhuma evidência de briga. O legista apontou "morte acidental ou suicídio" no B.O., mas gente próxima de Fuller nunca acreditou nisto. Esse pessoal sempre levantou a hipótese de assassinato apontando Charles Manson como suspeito. A polícia investigou conexão de Fuller com uma mulher ligada à Máfia, mas nada concluiu. Ele foi enterrado no Forest Lawn Memorial Park, nas colinas de Hollywood, e sua morte entrou para aqueles casos de "mistérios não resolvidos").
O curto período de estrelado de Fuller coroou cinco anos de gravações, durante os quais ele lançou ótimos discos. Após alguns singles locais em sua cidade-natal de El Paso, TX, no início dos anos 60, ele mudou-se para a Califórnia com sua banda em 64 e experimentou tocar Surf Music, antes de conhecer o produtor Bob Keene. Aí, ele gravou pelo selo Mustang em 1965/66 por onde perpetrou seus hits, entre eles "Let Her Dance", "Another Sad And Lonely Night", "My True Love", "Never To Be Forgotten", "Fool Of Love" e "The Magic Touch". Todas mostravam Fuller como um legítimo herdeiro das tradições do Rock'n'Roll/Rockabilly inicial, sem soar revivalista. Bem, enquanto é difícil imaginá-lo conseguindo manter o sucesso durante a era da Psicodelia, mesmo assim ele poderia ter produzido um trabalho interessante. Era um compositor talentoso, um ás no estúdio e acabou deixando muitas gravações inéditas em estúdio/ao vivo (material que foi lançado nos anos 80, quando sua perda começou a ser reavaliada).
Esta caixinha de 3CDs, "Never To Be Forgotten: The Mustang Years" (da Del-Fi Records, lançada em 1998), inclui tudo que Fuller gravou para o selo Mustang entre 1964/66. Todos os discos e uma dúzia de inéditas. É talvez a melhor coletânea dele a ser adquirida. Embora a música seja excelente, 3CDs é algo mais para fãs. Para quem só quiser uma coletânea simples tipo "Best Of...", a Rhino tem "I Fought The Law - The Best Of The Bobby Fuller Four". Os discos de Fuller eram cheios de faixas não memoráveis e Rocks genéricos, que soavam feitos sob pressão. Por isso, para quem quiser só o essencial, a segunda é uma melhor dica (apenas 12 faixas). Fuller era um mestre em combinar Rockabilly, Buddy Holly, Folk Rock e o bom e velho R'n'R inicial. Era um tipo de som que ele conseguia como poucos. Claro que uma coletânea tão enxuta deixa de fora muita coisa boa (gemas como "The Magic Touch", "It's Love Come What May", "My True Love", "Saturday Night" e "Never To Be Forgotten" são exemplos de omissões, o que prejudica o título "best of", sem contar que não traz nenhuma gravação dele pelos pequenos selos do Texas, antes da mudança para L.A.).
Aliás, para cobrir tais lacunas só mesmo adquirindo a primeira dica e "Shakedown! The Texas Tapes Revisited" (de 1996, também da Del-Fi Records), a melhor compilação de material gravado por Fuller entre 1961/64, antes dele assinar com o selo Mustang. São 2CDs com 52 faixas contendo os ambos lados de 7 singles que ele fez para selos como Yucca, Eastwood, Exeter e Todd, mais um monte de inéditas e alt-takes. Não tão polidas quanto suas gravações posteriores e mais derivativas de seus ídolos (particularmente Buddy Holly), mas quase tão bom quanto o repertório mais celebrado de Holly. Tudo muito energético e melódico.
A canção pela qual para sempre Bobby Fuller será lembrado é sua versão de "I Fought The Law", amada no cânone do Rock por causa de riff cativante, de seu desempenho vocal maravilhoso, letra de amor perdido/rebeldismo/fatalidade e um dos mais indeléveis refrões da história. Confira:
Curiosamente, há pouco tempo atrás, o selo Norton Records lançou a gravação original demo de "I Fought The Law" feita por Fuller em casa. Para surpresa geral, ela era ainda melhor (!) do que a versão que todos sempre conhecem. Aparentemente, Fuller experimentou bastante durante o processo de gravação. Ele havia empenhado alguns anos para se tornar conhecido como bom músico, havia tocado um selo independente (o Exeter) e havia se dedicado à engenharia de som.
Na biografia de Fuller, "I Fought The Law", escrita por seu irmão:
Na biografia de Fuller, "I Fought The Law", escrita por seu irmão:
"Eu estava na sessão de gravação de 'I Fought The Law'. Bobby ajeitou tudo, fez todo o trabalho de ajustes e configurações. Ele corria do celeiro, passando pela garagem até o almoxarifado (que era sua cabine de controle).Ele tinha dois gravadores Ampex. Tinha construído uns cubículos com tela de galinheiro e criou ali uma versão caseira de um estúdio de gravações. Cheguei lá por volta das 9:30, fiquei até 16:30 e Bobby ainda ficou trabalhando".Ficou curioso para ouvir esta versão? Aqui está ela:
Duca, né? Vocais dobrados, o som limpo da guitarra, um clima solto e cheio de espírito/vibração. Chama atenção também ele cantar "robbing people with a shotgun" ao invés de "six-gun", como na versão mais conhecida. Os roqueiros menos entendidos conhecem "I Fought The Law" da versão do The Clash. Ela consta do álbum de estreia deles (na versão norte-americana), de 1977. O próprio Sonny Curtis já declarou que esta versão é uma de suas favoritas. A banda teve a ideia de gravá-la durante as sessões para seu segundo álbum, "Give 'Em Enough Rope". Originalmente, ela foi gravada para o filme "Rude Boy". O ritmo contagiante, as letras e seu refrão "I fought the law and the law won" são eternos. Duca total.
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