quarta-feira, 12 de outubro de 2022

Captain Beefheart num confronto com a plateia em 1975

No final de 1975, a carreira do grande Captain Beefheart estava confusa e frustrante. Depois que dois álbuns direcionados ao mainstream não conseguiram ser bem sucedidos nas vendas ("Unconditionally Guaranteed" e "Bluejeans & Moonbeams", ambos de 74e da dissolução de sua Magic Band, ele procurou seu velho amigo Frank Zappa. Beefheart na sequência se juntaria à última encarnação do Mothers of Invention para uma turnê e o álbum "Bongo Fury" (lançado em out/75). Depois, como parte de seu desejo de retornar às suas raízes do Rock de vanguarda, ele recriaria a Magic Band. Mas não foi só porque as coisas estavam em alta e voltando a funcionar que o Captain notoriamente rabugento manteria sempre a calma. Depois que "Bongo Fury" foi concluído, Beefheart recrutou membros do Mothers e convenceu alguns veteranos da Magic Band a voltarem ao jogo. Naquele mesmo out/75, a nova Magic Band caiu na estrada, tocando faixas clássicas de Beefheart (seu material então mais recente, de perfil comercial, foi ignorado) para audiências em toda a Europa e EUA. Inclusive, haveria um punhado de datas abrindo para Zappa, na última semana do ano.
O show de 27/dez foi realizado no Winterland Ballroom em San Francisco. O concerto entrou para a história pelas trocas acaloradas do Captain com a multidão. Beefheart tinha temperamento forte e já havia confrontado audiências antes, mas nesta noite foi algo completamente diferente. Anos depois, membros da Magic Band contariam o que realmente aconteceu.
Veja o que disse o guitarrista Denny Walley:
"Aquele [show] foi memorável para mim porque foi um em que o público começou a vaiar e jogar coisas em nós, depois que Don (Don Van Vliet era o nome verdadeiro do Captain Beefheart) tinha mostrado o dedo médio a alguém. Alguém tinha feito o dedo para ele. Frank era a atração principal. Abrimos para ele. Frank costumava fazer muito o dedo para o público - era uma maneira de dizer "Oi!" Mas para Don era uma maneira de dizer: "Foda-se!" Então, ele ficou puto e mostrou o dedo bem na cara do cara e a próxima coisa que aconteceu foi que muitas pessoas ficaram com raiva e eles começaram a vaiar e jogar lixo. Virou uma zona de xingamentos e outras coisas" (tirado do livro "Beefheart: Through The Eyes Of Magic").
Numa entrevista em 2000, o multi-instrumentista e líder da Magic Band, John "Drumbo" French, disse o seguinte sobre o que aconteceu naquela noite:
"Don fez o dedo para o cara de uma forma insultante, fez bem na cara dele e começou a lançar insultos para o público. O objetivo desse comportamento parecia ser provocar intencionalmente o público. As pessoas foram jogando objetos no palco. Fiquei chateado com Don por não apenas ignorar o cara e se fazer o show. Don depois deixou o palco. Tocamos 'Alice in Blunderland' e apaziguamos um pouco o público, mas assim que Don voltou, eles se tornaram hostis novamente. Depois, fomos para o camarim, que estava completamente escuro. Don tinha quebrado todas as luzes. Todas as luzes do camarim estavam quebradas e havia cacos de vidro por toda parte. Ele estava dizendo 'Eu queria que o público fizesse isso, cara! Era exatamente isso que eu queria que eles fizessem!' Foi uma noite muito nervosa, mas certamente não era a primeira vez que Don conseguia brigar com uma multidão inteira daquele jeito".
Embora uma audience tape desta performance em Winterland circule na internet há tempos, não era bem gravada. Mas recentemente, surgiu um novo áudio proveniente de uma fita de primeira geração. Veio de um colecionador anônimo que diz tê-la obtido do taper (cara que gravou o show) pouco depois dele ter acontecido. Este colecionador também revelou que o tal taper não era outro senão Matt Groening – o futuro criador da série Simpsons. É mole? Groening foi/é um grande fã de Beefheart e acredita-se que ele tenha gravado várias performances do artista na Bay Area.
Ingber, Beefheart, Walley, Fowler e French.
A formação da Magic Band nesta noite foi (a da foto acima):
Captain Beefheart: vocais, sax e harmônica;
John 'Drumbo' French: bateria, percussão, guitarra (em 'Dali’s Car');
Bruce 'Fossil' Fowler: trombone;
Elliot Ingber 'Winged Eel Fingerling': guitarra e slide guitar;
Denny Walley 'Feeler’s Reedo/Walla Walla': guitarra e slide guitar.
O setlist foi:
01. Introduction
02. Moonlight On Vermont
03. Abba Zaba
04. Orange Claw Hammer
05. Don addresses the audience
06. Dali’s Car
07. When It Blows It Stacks
08. My Human Gets Me Blues
09. Band introductions
10. Alice In Blunderland
11. Untitled improvisations
12. Electricity
13. Golden Birdies
14. Big Eyed Beans From Venus

Então, sem mais delongas, vamos ao áudio. Ele realmente é mais claro do que outras versões deste show, com ajustes de velocidade e volume. Os problemas começam e são percebidos pela primeira vez antes de "Orange Claw Hammer". Durante sua 'band introductions', o Captain dispara seus muito peculiares e próprios tipo de insultos à multidão, incluindo este excepcional: "It’s like playing for a jar of pickles and trying to turn them back into cucumbers" (tradução: é como jogar por um pote de picles e tentar transformá-los de volta em pepinos"). ré-ré-ré.
Vou fechar postando um vídeo que achei no YouTube (onde mais?) com Matt Groening contando como surgiu seu amor pelo icônico álbum "Trout Mask Replica", do Captain Beefheart & his Magic Band:

Um comentário:

  1. Isso era louco de pedra! Polêmico, controverso e genial. Até a história de sua vida é fora da curva! Um personagem emblemático do que o rock tem de mais genuíno!

    ResponderExcluir

Comentários são bem vindos, desde que respeitosos da opinião alheia e sejam construtivos para o debate de ideias.